Engenharia Reversa
Parte XIV - O Templo
O grande veículo industrial se movimenta pela rua em direção a uma escotilha incrustada no asfalto. De súbito, a máquina para exatamente sobre ela, a encobrindo totalmente. Então, um motor é ativado e grandes pernas de metal, seis ao todo, semelhantes as patas de um aracnídeo, se desdobram da carroceria do veículo, fixando-se no asfalto em volta do monstro de metal. Vários giroflexos espalhados pelo corpo da máquina começam a funcionar e sirenes estridentes preenchem o ar com seus sons agudos e irritantes.
Ao redor do colosso, centenas de oficiais da UNI-Tron armados até os dentes e não sabendo bem o que vão encontrar pela frente esperam pelo término do serviço. Mais próximos do veículo e se destacando em meio ao grupo de policiais, estão os agentes da VNR com suas chamativas armaduras vermelhas, mas é Amanda Makarim, vestida com couraças negras e brilhantes, quem mais aparece nas câmeras voadoras que pairam nos céus e transmitem tudo para os canais de notícias.
Ela está com o rifle preso às costas e suãs mãos estão ocupadas segurando, em cada uma, duas reluzentes maletas de metal. Então um forte estrondo se faz ouvir, e as sirenes da grande máquina cessam. Apoiando-se em três das seis robustas pernas de metal, o veículo flexiona seu grande corpo, levantando-se no ar em um movimento impressionante. Um grupo de policiais se afasta rapidamente, percebendo que a máquina está prestes a "pousar" sobre o lugar que eles estavam ocupando.
Agora, onde antes havia apenas uma escotilha, existe um grande buraco, perfeitamente delimitado em um círculo impecável. A colossal máquina começa a se afastar, e para muitos o robô industrial parece exibir um certo ar de pompa, como se estivesse orgulhoso pelo serviço prestado. Então, o tenente da UNI-Tron se aproxima do círculo e o examina; ativa seu comunicador e usando a rede local da Força entre em contato com o efetivo:
- Atenção todas as unidades, entraremos nos subterrâneos em dez minutos. Controle Tático, envie todos os drones para dentro do túnel!
- Não. Esperem. - a voz de Amanda invade a transmissão, causando surpresa ao tenente e a muitos oficiais.
- O quê? Como você entrou em nossa rede local? Essa é uma banda de dados exclusiva da UNI-Tron! Acesso não-autorizado é passível de punição!
- Ora essa, tenente, não se faça de bobo! A VNR tem autorização total concedida pelo Conselho Corporativo, e você sabe disso. - Argumenta Amanda, estranhamente divertida.
O sangue do tenente ferve, mas ele sabe que a agente corporada diz a verdade. Mesmo poderosa, a UNI-Tron não é uma força autônoma, ela, como quase tudo no novo mundo, está sujeita ao controle das Corporações Globais.
- Seus drones são muito barulhentos, podem facilmente ser detectados e pior ainda, podem informar aos aliados dos terroristas que estamos nos aproximando. - enquanto fala, Amanda se aproxima do círculo aberto pelo robô.
- Além disso, eles são lentos. E podem ser facilmente destruídos. Lembre-se, tenente, essas galerias são como um verdadeiro labirinto, e nós não temos mapas ou registros dessa parte da cidade, porque simplesmente nunca nos importamos.
Agora, com todos os olhares e ouvidos voltados para ela, Amanda coloca as duas malas de metal no chão e se ajoelha em uma perna, perto dos objetos. Então, sem nenhuma pressa, abre os dois recipientes; automaticamente, um conjunto de prateleiras sobrepostas se ergue de dentro de cada um deles. Pela distância em que estão, os oficiais e mesmo as câmeras nos drones midiáticos não conseguem ver nada, as prateleiras estão, aparentemente, vazias! Ela pensa em um comando e imediatamente todas as transmissões dos drones civis são interrompidas, então ativa sua filmadora acoplada no capacete da armadura, e começa a transmitir as imagens em tempo real para a rede local da UNI-Tron. Logo, todos os oficiais conseguem ver, abismados, que as prateleiras estão repletas de diminutos insetos alados, dispostos em filas indianas. De maneira sincronizada, os pequenos seres começam a mover suas asas e logo levantam voo.
Uma nova tela virtual se forma nas retinas de Amanda, onde as imagens enviadas pelos insetos são exibidas em uma resolução incrível. Ela alterna as transmissões, checando o sinal das câmeras de cada um deles. Então, com um comando mental, coloca o enxame em formação e o faz mergulhar velozmente dentro do círculo aberto no chão. Eles se dividem em vários pequenos grupos e, com uma velocidade absurda, começam a adentrar os subterrâneos, se espalhando pelos túneis e galerias. Amanda ativa um filtro nas câmeras, mudando-as para visão noturna. Então, compartilha as imagens dos insetos com o restante dos agentes da VNR e também com os policiais da UNI-Tron.
- Insetos robôs! - Diz o tenente, embasbacado.
- Não. Não são robôs. São seres vivos artificialmente criados e geneticamente modificados, micro-ciborgues, para ser mais exata.
O tenente já havia visto muita coisa ao longo de seus quase vinte anos de serviço, mas nada se comparava aquilo. Entretanto, ele não poderia se deixar envolver pela tecnologia daqueles miseráveis corporados, ele odiava o fato da Força estar subjugada ao crivo das mega-empresas.
- Certo agente Amanda, seus insetos são bem mais rápidos que nossos drones, mas mesmo assim, como vamos encontrar os terroristas lá em baixo? Devem existir centenas, senão milhares de túneis!
- Não se preocupe Tenente. Eles estão programados para localizar humanos, podem detectar pessoas a centenas de metros, rastreiam o calor e os odores do corpo, entre outras coisas. Preparem-se, nós vamos entrar.
Amanda pega seu rifle e, rapidamente, salta para dentro do círculo. Os agentes da VNR vão em seguida, sincronizados com ela. Os oficiais da UNI-Tron se aproximam e, motivados pela incrível tecnologia exibida, imitam os passos dos agentes.
Então, minutos depois de adentrar um dos túneis, Amanda começa a receber os dados dos insetos e, instantaneamente, um mapa em 3D do local começa a ser desenhado e transmitido para todos os grupos.
De súbito, ela tem sua atenção atraída por um indicador piscante na interface digital projetada em sua retina: um dos insetos encontrou alguma coisa, um rastro de calor! Um pequeno sorriso se forma no rosto da Rainha de Fogo.
- Atenção todas as unidades, estou marcando no mapa a rota dos terroristas. Agora é só uma questão de tempo.
***
- Merda! Essa imundice não termina nunca! - diz Davi com a voz falhando, para em seguida tossir copiosamente. Sua visão arde e seu corpo começa a queimar de febre, tudo devido à água que ele havia engolido a quase uma hora atrás. Carregado por Marcela e Thiago, o bio-hacker mal consegue mover suas pernas, e luta como pode para se manter consciente.
Atrás deles, os filhos de Alfa Um continuam resolutos, não abaixam suas armas um segundo e não aparentam nenhum cansaço. Isaías, o mais alto e forte dos três, é o que demonstra mais ansiedade, apressando os prisioneiros e gritando com eles quando percebe que estão diminuindo o ritmo.
- Andem mais rápido! Ou vamos matá-los aqui mesmo e deixar seus corpos para apodrecerem pela eternidade!
- Cara... Por favor, o Davi tá doente, não vamos conseguir chegar em lugar nenhum assim! - Protesta Thiago, exausto.
- Continuem andando! - Esbraveja nervosamente Isaías.
Sem nenhuma outra saída os dois obedecem, usando as últimas forças para carregar Davi. Repentinamente, os passos se tornam mais difíceis, e Marcela percebe que eles atingiram algum tipo de subida. Ela se desequilibra e quase deixa Davi cair, porém, os dois Filhos de Alfa Um, enfim, correm para ajudá-la, segurando Davi e também aliviando um pouco para Thiago.
Ela tenta se apoiar no chão, molhando sua jaqueta, mas Isaías a segura pelo braço e sem o menor esforço coloca a engenheira novamente de pé, forçando-a a continuar andando.
Agora eles começam a subir, e em pouco tempo a água se resume a uma fina camada que desce pela inclinação. Alguns minutos depois, chegam em um lugar quase seco e totalmente diferente do restando do túnel e das galerias lá em baixo. É um cômodo retangular, com o teto bastante alto e um razoável espaço entre as paredes laterais, formando um corredor que termina em uma grande porta em forma de círculo, de aço, e que lembra bem uma porta redonda de cofre de banco. Thiago, impressionado, nota que existem várias pequenas luzes coloridas nela, indicando que ali existe um mecanismo eletrônico de controle. Marcela repara nas paredes, que são negras, reluzentes, e repletas de desenhos e símbolos tribais pintados em dourado. "Cromo?" Ela pensa, imaginando o material que utilizaram para construir aquela antessala.
- Chegamos! - Vocifera euforicamente Isaías.
Um forte e abafado estampido é ouvido, revelando um mecanismo escondido nas paredes. Em segundos, a grande porta circular começa a se mover, abrindo-se para fora na direção do grupo e liberando uma luminosidade amarela e que vai aos poucos tomando conta do lugar. Os corações dos prisioneiros aceleram, e eles são forçados a protegerem seus olhos quando a porta se abre totalmente e a luz invade por completo a antessala, Marcela, gentilmente, protege as vistas de Davi.
Devido a seus óculos espelhados, os Filhos de Alfa Um não são afetados para forte luminosidade, e levantam seus braços para cima, com as armas em punho, realizando uma estranha saudação.
De relance, Thiago percebe vultos surgindo em meio a luz. Eles se movem rapidamente na direção do grupo.
- Abram os olhos, gado! - Ordena Isaías - Vocês se acostumaram às trevas do subterrâneo, mas logo vão se adaptar a claridade de nosso Templo!
Os vultos, que agora Thiago percebe, são mais Filhos de Alfa Um, se aproximam deles e os forçam a remover as mãos da frente dos olhos, ao mesmo tempo em que revistam os prisioneiros. Exausto, Klein não reage quando sua pistola é encontrada e removida. Um dos novos guerreiros se dirige a Isaías:
- Você chegou bem a tempo, irmão. Estão todos ansiosos pelo retorno da Mãe, e agora, enfim, poderemos tê-la conosco! Vamos entrar, os Carrascos da Babilônia estão nos subterrâneos, mas jamais vão encontrar nossa cidade!
- Também estou muito feliz, irmão, apesar de perdermos muitos para resgatar esse três escravos, esse gado! - fala com desprezo, então continua - Mas agora, aquele miserável terá que cumprir sua parte no acordo!
- Sim, de fato!
- Ah, tem outra coisa, Proteus, um deles bebeu da água dos túneis, precisa ser curado o quanto antes. Eu não me importo com eles, por mim deixaria que apodrecessem aqui em baixo, mas aquele carrasco desgraçado poderá não gostar disso...
Proteus olhou para baixo e sacudiu a cabeça, pensativo. Então logo voltou a falar:
- É verdade, não podemos falhar. Pode deixar comigo, irmão, vou cuidar disso.
O grupo então adentra pelo portão circular. Thiago, Marcela e Davi começam a recuperar a visão, e não acreditam no que seus olhos revelam: O Templo é inacreditável: um grande salão em forma de hexágono, onde em cada vértice, gigantescos pilares sobem por uma altura de aproximadamente quinze metros, revelando muitos andares e sacadas repletos de filhos e filhas de Alfa Um. Grandes holofotes no teto projetam luzes amarelas para baixo, e nas paredes mais próximas do solo, centenas de gravuras parecem contar uma estranha história, onde Thiago de imediato reconhece desenhos que lembram os primeiros bio-computadores. Tudo parece ser feito de pedra, pedras de uma coloração vermelha nas pilastras e nas paredes, exceto nas partes das gravuras, onde um amarelo desbotado predomina no segundo plano dos desenhos. Eles podem ver muitas portas que levam a outros corredores, tem muita gente sindo por eles e se aglomerando no grande salão. Um burburinho inquietante preenche o ar, revelando que algo muito importante está acontecendo.
O lugar está lotado: centenas de filhos e filhas de Alfa Um, crianças, idosos, mulheres grávidas, todos vestidos pobremente com seus trapos imundos, e as incômodas placas de circuitos espalhadas pelas roupas e pelos corpos.
É uma verdadeira comunidade vivendo nas profundezas de Vix. E todos olham para eles, e olham com ódio, mas também com uma certa esperança. "Meu Deus", diz Marcela, boquiaberta ao perceber as expressões nos rostos daquelas pessoas, daquela tribo.
Então duas mulheres se aproximam e, com gestos brutos, pegam Davi e começam a levá-lo para longe.
- Ei! O que vocês vão fazer com ele? - protesta Thiago, com Marcela fazendo uma cara de indignação, mas logo ele se cala quando muitos guerreiros apontam para eles suas armas rústicas.
- Vamos andando! - grita um dos captores, empurrando o hacker e a engenheira para dentro do salão, abrindo espaço em meio aos seus irmãos e irmãs. Eles se movem rapidamente e logo atingem o centro, onde, em um pequeno pedestal, um velho se destaca em meio a multidão.
Diferente da maioria, o ancião tem a pele bem alva, e Marcela repare em seus olhos, de um azul profundo. Não tem mais cabelos e também veste um manto tão sujo quanto os dos outros, mas sem nenhum tipo de circuito. O velho é bem magro, quase uma caveira, e sua pele enrugada parece querer se desprender do corpo e cair a qualquer momento, seu rosto é duro, com traços bem mercados e várias rugas, refletindo a idade avançada, um nariz grande e aquilino o deixa com um certo ar de superioridade, porém, o que mais chama a atenção nele é o que parece ser uma grande antena, fina, prateada, que se projeta de suas costas, ela parece sair de dentro de sua coluna.
Então, a uns seis metros de distância do homem, uma visão perturbadora estarrece Marcela e Thiago: em uma pequena plataforma também elevada acima do chão, Maestro está de pé, com Bel a sua frente, e com um braço firme ao redor do pescoço da moça, aplicando uma gravata e a imobilizando; com sua outra mão, ele aponta uma pistola automática para a cabeça dela.
- Zardor! Eles estão aqui! Isaías conseguiu! - Grita o Filho e Alfa Um que está com Marcela e Thiago cativos. O burburinho subitamente termina, e todos, sem exceções, voltam seus olhares para Maestro.
O velho soturnamente crava seus frios olhos azuis no deletador e então, de uma maneira solene, profere suas palavras:
- Como combinado, carrasco, aqui estão seus comparsas! Agora, exijo que você liberte nossa Mãe! Já!
- Liberte-a! Liberte-a! - gritam as pessoas, formando um coral lamuriante e ao mesmo tempo assustador.
Marcela vê a expressão de terror nos olhos de Bel; então olha para Maestro e vê o homem engolindo seco.
Ao redor do colosso, centenas de oficiais da UNI-Tron armados até os dentes e não sabendo bem o que vão encontrar pela frente esperam pelo término do serviço. Mais próximos do veículo e se destacando em meio ao grupo de policiais, estão os agentes da VNR com suas chamativas armaduras vermelhas, mas é Amanda Makarim, vestida com couraças negras e brilhantes, quem mais aparece nas câmeras voadoras que pairam nos céus e transmitem tudo para os canais de notícias.
Ela está com o rifle preso às costas e suãs mãos estão ocupadas segurando, em cada uma, duas reluzentes maletas de metal. Então um forte estrondo se faz ouvir, e as sirenes da grande máquina cessam. Apoiando-se em três das seis robustas pernas de metal, o veículo flexiona seu grande corpo, levantando-se no ar em um movimento impressionante. Um grupo de policiais se afasta rapidamente, percebendo que a máquina está prestes a "pousar" sobre o lugar que eles estavam ocupando.
Agora, onde antes havia apenas uma escotilha, existe um grande buraco, perfeitamente delimitado em um círculo impecável. A colossal máquina começa a se afastar, e para muitos o robô industrial parece exibir um certo ar de pompa, como se estivesse orgulhoso pelo serviço prestado. Então, o tenente da UNI-Tron se aproxima do círculo e o examina; ativa seu comunicador e usando a rede local da Força entre em contato com o efetivo:
- Atenção todas as unidades, entraremos nos subterrâneos em dez minutos. Controle Tático, envie todos os drones para dentro do túnel!
- Não. Esperem. - a voz de Amanda invade a transmissão, causando surpresa ao tenente e a muitos oficiais.
- O quê? Como você entrou em nossa rede local? Essa é uma banda de dados exclusiva da UNI-Tron! Acesso não-autorizado é passível de punição!
- Ora essa, tenente, não se faça de bobo! A VNR tem autorização total concedida pelo Conselho Corporativo, e você sabe disso. - Argumenta Amanda, estranhamente divertida.
O sangue do tenente ferve, mas ele sabe que a agente corporada diz a verdade. Mesmo poderosa, a UNI-Tron não é uma força autônoma, ela, como quase tudo no novo mundo, está sujeita ao controle das Corporações Globais.
- Seus drones são muito barulhentos, podem facilmente ser detectados e pior ainda, podem informar aos aliados dos terroristas que estamos nos aproximando. - enquanto fala, Amanda se aproxima do círculo aberto pelo robô.
- Além disso, eles são lentos. E podem ser facilmente destruídos. Lembre-se, tenente, essas galerias são como um verdadeiro labirinto, e nós não temos mapas ou registros dessa parte da cidade, porque simplesmente nunca nos importamos.
Agora, com todos os olhares e ouvidos voltados para ela, Amanda coloca as duas malas de metal no chão e se ajoelha em uma perna, perto dos objetos. Então, sem nenhuma pressa, abre os dois recipientes; automaticamente, um conjunto de prateleiras sobrepostas se ergue de dentro de cada um deles. Pela distância em que estão, os oficiais e mesmo as câmeras nos drones midiáticos não conseguem ver nada, as prateleiras estão, aparentemente, vazias! Ela pensa em um comando e imediatamente todas as transmissões dos drones civis são interrompidas, então ativa sua filmadora acoplada no capacete da armadura, e começa a transmitir as imagens em tempo real para a rede local da UNI-Tron. Logo, todos os oficiais conseguem ver, abismados, que as prateleiras estão repletas de diminutos insetos alados, dispostos em filas indianas. De maneira sincronizada, os pequenos seres começam a mover suas asas e logo levantam voo.
Uma nova tela virtual se forma nas retinas de Amanda, onde as imagens enviadas pelos insetos são exibidas em uma resolução incrível. Ela alterna as transmissões, checando o sinal das câmeras de cada um deles. Então, com um comando mental, coloca o enxame em formação e o faz mergulhar velozmente dentro do círculo aberto no chão. Eles se dividem em vários pequenos grupos e, com uma velocidade absurda, começam a adentrar os subterrâneos, se espalhando pelos túneis e galerias. Amanda ativa um filtro nas câmeras, mudando-as para visão noturna. Então, compartilha as imagens dos insetos com o restante dos agentes da VNR e também com os policiais da UNI-Tron.
- Insetos robôs! - Diz o tenente, embasbacado.
- Não. Não são robôs. São seres vivos artificialmente criados e geneticamente modificados, micro-ciborgues, para ser mais exata.
O tenente já havia visto muita coisa ao longo de seus quase vinte anos de serviço, mas nada se comparava aquilo. Entretanto, ele não poderia se deixar envolver pela tecnologia daqueles miseráveis corporados, ele odiava o fato da Força estar subjugada ao crivo das mega-empresas.
- Certo agente Amanda, seus insetos são bem mais rápidos que nossos drones, mas mesmo assim, como vamos encontrar os terroristas lá em baixo? Devem existir centenas, senão milhares de túneis!
- Não se preocupe Tenente. Eles estão programados para localizar humanos, podem detectar pessoas a centenas de metros, rastreiam o calor e os odores do corpo, entre outras coisas. Preparem-se, nós vamos entrar.
Amanda pega seu rifle e, rapidamente, salta para dentro do círculo. Os agentes da VNR vão em seguida, sincronizados com ela. Os oficiais da UNI-Tron se aproximam e, motivados pela incrível tecnologia exibida, imitam os passos dos agentes.
Então, minutos depois de adentrar um dos túneis, Amanda começa a receber os dados dos insetos e, instantaneamente, um mapa em 3D do local começa a ser desenhado e transmitido para todos os grupos.
De súbito, ela tem sua atenção atraída por um indicador piscante na interface digital projetada em sua retina: um dos insetos encontrou alguma coisa, um rastro de calor! Um pequeno sorriso se forma no rosto da Rainha de Fogo.
- Atenção todas as unidades, estou marcando no mapa a rota dos terroristas. Agora é só uma questão de tempo.
***
- Merda! Essa imundice não termina nunca! - diz Davi com a voz falhando, para em seguida tossir copiosamente. Sua visão arde e seu corpo começa a queimar de febre, tudo devido à água que ele havia engolido a quase uma hora atrás. Carregado por Marcela e Thiago, o bio-hacker mal consegue mover suas pernas, e luta como pode para se manter consciente.
Atrás deles, os filhos de Alfa Um continuam resolutos, não abaixam suas armas um segundo e não aparentam nenhum cansaço. Isaías, o mais alto e forte dos três, é o que demonstra mais ansiedade, apressando os prisioneiros e gritando com eles quando percebe que estão diminuindo o ritmo.
- Andem mais rápido! Ou vamos matá-los aqui mesmo e deixar seus corpos para apodrecerem pela eternidade!
- Cara... Por favor, o Davi tá doente, não vamos conseguir chegar em lugar nenhum assim! - Protesta Thiago, exausto.
- Continuem andando! - Esbraveja nervosamente Isaías.
Sem nenhuma outra saída os dois obedecem, usando as últimas forças para carregar Davi. Repentinamente, os passos se tornam mais difíceis, e Marcela percebe que eles atingiram algum tipo de subida. Ela se desequilibra e quase deixa Davi cair, porém, os dois Filhos de Alfa Um, enfim, correm para ajudá-la, segurando Davi e também aliviando um pouco para Thiago.
Ela tenta se apoiar no chão, molhando sua jaqueta, mas Isaías a segura pelo braço e sem o menor esforço coloca a engenheira novamente de pé, forçando-a a continuar andando.
Agora eles começam a subir, e em pouco tempo a água se resume a uma fina camada que desce pela inclinação. Alguns minutos depois, chegam em um lugar quase seco e totalmente diferente do restando do túnel e das galerias lá em baixo. É um cômodo retangular, com o teto bastante alto e um razoável espaço entre as paredes laterais, formando um corredor que termina em uma grande porta em forma de círculo, de aço, e que lembra bem uma porta redonda de cofre de banco. Thiago, impressionado, nota que existem várias pequenas luzes coloridas nela, indicando que ali existe um mecanismo eletrônico de controle. Marcela repara nas paredes, que são negras, reluzentes, e repletas de desenhos e símbolos tribais pintados em dourado. "Cromo?" Ela pensa, imaginando o material que utilizaram para construir aquela antessala.
- Chegamos! - Vocifera euforicamente Isaías.
Um forte e abafado estampido é ouvido, revelando um mecanismo escondido nas paredes. Em segundos, a grande porta circular começa a se mover, abrindo-se para fora na direção do grupo e liberando uma luminosidade amarela e que vai aos poucos tomando conta do lugar. Os corações dos prisioneiros aceleram, e eles são forçados a protegerem seus olhos quando a porta se abre totalmente e a luz invade por completo a antessala, Marcela, gentilmente, protege as vistas de Davi.
Devido a seus óculos espelhados, os Filhos de Alfa Um não são afetados para forte luminosidade, e levantam seus braços para cima, com as armas em punho, realizando uma estranha saudação.
De relance, Thiago percebe vultos surgindo em meio a luz. Eles se movem rapidamente na direção do grupo.
- Abram os olhos, gado! - Ordena Isaías - Vocês se acostumaram às trevas do subterrâneo, mas logo vão se adaptar a claridade de nosso Templo!
Os vultos, que agora Thiago percebe, são mais Filhos de Alfa Um, se aproximam deles e os forçam a remover as mãos da frente dos olhos, ao mesmo tempo em que revistam os prisioneiros. Exausto, Klein não reage quando sua pistola é encontrada e removida. Um dos novos guerreiros se dirige a Isaías:
- Você chegou bem a tempo, irmão. Estão todos ansiosos pelo retorno da Mãe, e agora, enfim, poderemos tê-la conosco! Vamos entrar, os Carrascos da Babilônia estão nos subterrâneos, mas jamais vão encontrar nossa cidade!
- Também estou muito feliz, irmão, apesar de perdermos muitos para resgatar esse três escravos, esse gado! - fala com desprezo, então continua - Mas agora, aquele miserável terá que cumprir sua parte no acordo!
- Sim, de fato!
- Ah, tem outra coisa, Proteus, um deles bebeu da água dos túneis, precisa ser curado o quanto antes. Eu não me importo com eles, por mim deixaria que apodrecessem aqui em baixo, mas aquele carrasco desgraçado poderá não gostar disso...
Proteus olhou para baixo e sacudiu a cabeça, pensativo. Então logo voltou a falar:
- É verdade, não podemos falhar. Pode deixar comigo, irmão, vou cuidar disso.
O grupo então adentra pelo portão circular. Thiago, Marcela e Davi começam a recuperar a visão, e não acreditam no que seus olhos revelam: O Templo é inacreditável: um grande salão em forma de hexágono, onde em cada vértice, gigantescos pilares sobem por uma altura de aproximadamente quinze metros, revelando muitos andares e sacadas repletos de filhos e filhas de Alfa Um. Grandes holofotes no teto projetam luzes amarelas para baixo, e nas paredes mais próximas do solo, centenas de gravuras parecem contar uma estranha história, onde Thiago de imediato reconhece desenhos que lembram os primeiros bio-computadores. Tudo parece ser feito de pedra, pedras de uma coloração vermelha nas pilastras e nas paredes, exceto nas partes das gravuras, onde um amarelo desbotado predomina no segundo plano dos desenhos. Eles podem ver muitas portas que levam a outros corredores, tem muita gente sindo por eles e se aglomerando no grande salão. Um burburinho inquietante preenche o ar, revelando que algo muito importante está acontecendo.
O lugar está lotado: centenas de filhos e filhas de Alfa Um, crianças, idosos, mulheres grávidas, todos vestidos pobremente com seus trapos imundos, e as incômodas placas de circuitos espalhadas pelas roupas e pelos corpos.
É uma verdadeira comunidade vivendo nas profundezas de Vix. E todos olham para eles, e olham com ódio, mas também com uma certa esperança. "Meu Deus", diz Marcela, boquiaberta ao perceber as expressões nos rostos daquelas pessoas, daquela tribo.
Então duas mulheres se aproximam e, com gestos brutos, pegam Davi e começam a levá-lo para longe.
- Ei! O que vocês vão fazer com ele? - protesta Thiago, com Marcela fazendo uma cara de indignação, mas logo ele se cala quando muitos guerreiros apontam para eles suas armas rústicas.
- Vamos andando! - grita um dos captores, empurrando o hacker e a engenheira para dentro do salão, abrindo espaço em meio aos seus irmãos e irmãs. Eles se movem rapidamente e logo atingem o centro, onde, em um pequeno pedestal, um velho se destaca em meio a multidão.
Diferente da maioria, o ancião tem a pele bem alva, e Marcela repare em seus olhos, de um azul profundo. Não tem mais cabelos e também veste um manto tão sujo quanto os dos outros, mas sem nenhum tipo de circuito. O velho é bem magro, quase uma caveira, e sua pele enrugada parece querer se desprender do corpo e cair a qualquer momento, seu rosto é duro, com traços bem mercados e várias rugas, refletindo a idade avançada, um nariz grande e aquilino o deixa com um certo ar de superioridade, porém, o que mais chama a atenção nele é o que parece ser uma grande antena, fina, prateada, que se projeta de suas costas, ela parece sair de dentro de sua coluna.
Então, a uns seis metros de distância do homem, uma visão perturbadora estarrece Marcela e Thiago: em uma pequena plataforma também elevada acima do chão, Maestro está de pé, com Bel a sua frente, e com um braço firme ao redor do pescoço da moça, aplicando uma gravata e a imobilizando; com sua outra mão, ele aponta uma pistola automática para a cabeça dela.
- Zardor! Eles estão aqui! Isaías conseguiu! - Grita o Filho e Alfa Um que está com Marcela e Thiago cativos. O burburinho subitamente termina, e todos, sem exceções, voltam seus olhares para Maestro.
O velho soturnamente crava seus frios olhos azuis no deletador e então, de uma maneira solene, profere suas palavras:
- Como combinado, carrasco, aqui estão seus comparsas! Agora, exijo que você liberte nossa Mãe! Já!
- Liberte-a! Liberte-a! - gritam as pessoas, formando um coral lamuriante e ao mesmo tempo assustador.
Marcela vê a expressão de terror nos olhos de Bel; então olha para Maestro e vê o homem engolindo seco.
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André Luis Almeida Barreto
Aspirante a escritor, inquieto por natureza, ainda tenho vontade de mudar o mundo ou pelo menos colocar um monte de gente para pensar. Viciado em livros, games, idéias loucas e sempre procurando coisas que desafiem minha imaginação.
Adorei mais uma vez o desenrolar da estória. Cada vez mais emocionante e cheio de ação.
ResponderExcluirValeu por compartilhar sua obra conosco.
Obrigado, Gislaine! Muito bacana saber que continua acompanhando e curtindo!
ExcluirNossa, o que dizer dessa novo capítulo? São tantas informações, tantas novidades que por mais que a gente tente adivinhar para onde tudo isso leva não passam de tentativas falhas.
ResponderExcluirAmanda merece o cargo e o título que tem, não poupará esforços para chegar ao que deseja, e por mais que eu saiba que se pode esperar tudo da sua história, ainda me surpreendo.
Como esperado, Davi aguenta os efeitos da água imunda que engoliu. Ele teria que ter muita sorte para não passar mal depois daquilo.
Mesmo sabendo que esses Filhos do Alfa Um eram estranhos, ver de perto a comunidade em que vivem é ainda mais estranho! Tento imaginar aqui com o máximo possível de detalhes e fico impressionada.
Você tem o dom de levar os leitores a curiosidade.
Abraços
Oi, Karina! Muito obrigado por ler o capítulo, bem legal saber que você está gostando da trama! Foi um longo caminho até aqui, e é gratificante saber que a história ainda surpreende! Abraços!
ExcluirSempre me surpreendo com a tecnologia avançada que você cria a cada capítulo, meus parabéns pela criatividade!
ResponderExcluirEm relação ao capítulo: que mistério é esse envolvendo Bel?! Óbvio que fiquei curiosa, aliás, como sempre rsrs, o legal é que o próximo capítulo está pertinho de ser postado ;)
Abraços!
Oi, Any, obrigado pelo comentário! Prepare-se, pq no próximo capítulo a coisa esquentar ainda mais!
ExcluirAbraços!
Agora estou mais curiosa e ansiosa para saber o que vai acontecer no final desse livro fantástico. Quanta ação e suspense tem, o que gosto muito em livros!
ResponderExcluirFalar que a coisa está ficando melhor é chover no molhado, não é?!?! kkkkkk
ResponderExcluirAguardando os próximos capítulos.
@_Dom_Dom
André!
ResponderExcluirCada vez mais viciada e cheia de tensão para ver o que ainda vem pela frente.
Adorei a ideia dos "seres vivos artificialmente criados e geneticamente modificados, micro-ciborgues".
Imagino tudo que podem fazer...
“A vida só pode ser compreendida, olhando-se para trás; mas só pode ser vivida, olhando-se para frente.”(Soren Kierkegaard)
cheirinhos
Rudy
http://rudynalva-alegriadevivereamaroquebom.blogspot.com.br/
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Eu, infelizmente não estou acompanhando.
ResponderExcluirTem muita coisa já. Preciso parar e ler tudo, afinal eu estava curtindo. Mas me atrapalhei e perdi o andar da carruagem :(