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18.9.20

Sobre a escrita: A arte em memórias [Stephen King]

Sobre a escrita: A arte em memórias

No rastro do mestre

Mais uma vez mergulho com vontade numa leitura do mestre Stephen King. Não tenho pudores em chamá-lo assim. Este não é seu primeiro livro não ficcional, já li também “Dança macabra”, um calhamaço que gostei mais, mas isto não me impediu de saborear este.

Sobre a escrita (Suma, 255 páginas) é um livro sobre “dicas” a escritores iniciantes ou não, a leitores curiosos, mas também é sobre memórias, que nos dá pista sobre como King chegou à “sua” escrita ou o porquê ele “precisa” escrever. Há referências próprias do inglês americano, mas em sua grande maioria o livro pode ser lido e aproveitado em sua totalidade.

Stephen King
Título: Sobre a escrita: A arte em memórias
Autor: Stephen King
Tradutor: Michel Teixeira
Editora: Suma
Gênero: Autobiografias
Páginas: 259
Edição:
Ano: 2015
Onde comprar: Amazon

Para quem gosta de uma boa aventura, um livro “não-ficção” pode ser bem maçante, uma tortura. Isso afugenta quem quer diversão. Porém, até em um livro assim, o velho e bom King, consegue subverter o que foi pré-estabelecido. Ao nos apresentar suas justificativas e ídolos, o faz como um exímio contador de histórias que é: cativante e magnético. Puro deleite!
De onde vêm as ideias? Sua resposta é simples e direta:

“(...)Somos escritores, e nunca perguntamos um ao outro de onde tiramos nossas ideias; nós sabemos que não sabemos.”

É claro que anotei os livros e as dicas do mestre. Poderia resumir este livro em “omita as palavras desnecessárias”, seria um bom começo.

Neste livro King nos conta como funcionam suas memórias e é como se estivéssemos lendo um de seus livros: linguagem coloquial, quase uma conversa de esquina, mas não sem um toque de horror:

“(...)A minha (infância) é um terreno nebuloso, em que lembranças ocasionais brotam como árvores solitárias... O tipo de memória que parece ter a intenção de pegar e devorar alguém.”

Não quero aqui reproduzir todas as dicas, quem quiser sabê-las deverá ler o livro e extrair o máximo dele. Mas preciso transcrever algumas passagens, deixá-las gravadas. Comecemos então pelo tio Oren, que ensinou ao sobrinho e futuro escritor o que é necessário no dia em que precisou de uma mãozinha para consertar uma tela:

“Quando a tela estava firme, tio Oren me mandou colocar a chave de fenda de volta na caixa de ferramentas e depois “passar os cadeados”. Foi o que fiz, mas fiquei intrigado. Perguntei por que ele carregara a caixa de ferramentas de Fazza pela casa toda se só precisava de uma chave de fenda. Ele poderia ter levado a chave de fenda no bolso de trás da calça.
— Podia, Stevie — respondeu ele, inclinando-se para pegar as alças —, mas eu não sabia se teria mais alguma coisa para fazer quando chegasse lá, não é? É melhor ter sempre as ferramentas consigo. Se não tiver, pode ser que você encontre alguma coisa inesperada e desanime.”

E quais seriam as ferramentas? O vocabulário (o pão da escrita); os elementos de estilo (evite a voz passiva e advérbios – essa me atingiu, adoro advérbios, rs); gramática, ritmo e o dom (talento). Mas não é tudo, é preciso determinação:

“(...)Às vezes é preciso perseverar, mesmo quando não se tem vontade, e às vezes você está fazendo um bom trabalho mesmo quando parece estar sentado escavando merda.”

Importante o mestre frisar que a história, a situação, deverá vir primeiro, nunca o enredo:

“(...)O enredo é tosco, mecânico, anticriativo. O enredo é, penso eu, o último recurso do bom escritor e a primeira escolha do idiota. A história advinda do enredo está propensa a ser artificial e dura.
A situação vem primeiro. Os personagens..vêm depois... Geralmente tenho uma ideia do possível final, mas nunca pedi a um grupo de personagens que fizessem as coisas de um jeito. Pelo contrário, quero que façam as coisas do jeito deles...”

É interessante vê-lo discorrendo sobre como suas personagens tomam forma e sobrepõem seus enredos:

“Nunca gostei de Carrie, a versão feminina de Eric Harris e Dylan Klebold — os adolescentes responsáveis pelo massacre de Columbine —, mas através de Sondra e Dodie consegui, pelo menos, entendê-la um pouco. Tenho pena dela e também de seus colegas, porque muito tempo atrás também fui um deles.”

Quem conhece a história de Carrie sabe que ela foi vítima de bullying feito pelos supostos amigos, mesmo quando isso ainda não era fruto de um estudo aprofundado. O mestre confessa que também já participou de brincadeiras que poderiam ter magoado seus colegas.

O massacre de Columbine é uma ferida aberta na carne americana, mas antes ainda houve algo parecido e que afetou profundamente o escritor — Michael Carneal atirou em um grupo de orações de jovens em Health High School, Kentucky. — Dentro do armário do estudante foi encontrada uma versão de “Fúria”, novela com um alto teor de violência, escrita pelo mestre. Por causa disso King proibiu sua republicação (passando a ser um item raro e com preço estratosférico para colecionadores), por acreditar que a mesma poderia servir de fio condutor para a violência.

Voltando ao livro, quero dizer que King, em momento algum se intitula um grande escritor e esta sua humildade nos aproxima dele, ainda mais se tratando de um cara que já vendeu milhões. Resumidamente ele diz existir escritores ruins, bons e excelentes, uma verdadeira pirâmide, exatamente nesta ordem. Tem consciência que se encontra entre os bons, nunca será excelente. E deixa claro que todo escritor que se preze deve ler muito e escrever muito:

“A boa escrita, por sua vez, ensina ao escritor aprendiz sobre estilo, narração elegante, desenvolvimento de enredo e criação de personagens críveis, e também sobre como dizer a verdade. Um romance como As vinhas da ira pode gerar a boa e velha inveja e levar o novato ao desespero — “Nunca serei capaz de escrever algo tão bom, nem que viva mil anos” —, mas tais sentimentos também podem servir como estímulo, motivando o escritor a trabalhar mais e mirar mais alto...”

Enfim, e aí percebo que valeu cada minuto da leitura deste livro, vem uma afirmação coerente de quem consegue atingir o coração de qualquer leitor através da palavra:

“... A língua nem sempre usa gravata e sapato social. O objetivo da ficção não é a correção gramatical, mas fazer o leitor se sentir à vontade e, depois, contar uma história... Fazer com que ele esqueça, sempre que possível, que está lendo uma história. O parágrafo de uma única frase lembra mais a fala que a escrita, e isso é bom. Escrever é seduzir. Falar bem é parte da sedução. Se não fosse, por que tantos casais começariam a noite jantando e a terminariam na cama?”

O mestre, através de suas criações, tem a arte e o dom de nos seduzir e por isso é idolatrado pela grande maioria de leitores que sentem que suas histórias não são sobre medos, assassinos, fantasmas, mas sim sobre “pessoas”. Vida longa a Stephen King!

21 comentários em "Sobre a escrita: A arte em memórias [Stephen King]"

  1. Rodolfo!
    Confesso que não costumo ler livros de não-ficção, mas aqui estamos falando de nada mais nada menos do que um dos maiores autores da atualidade, não é verdade?
    King é meu autor preferido justamente porque faz qualquer coisa se tornar interessante, o que não é diferente aqui. Além de dar dicas valiosas para quem está ou quer seguir uma carreira de escritor, Stephen mostra ao leitor um lado pessoal, e sabemos muito bem que o autor passou por muitas situações na vida que inspiraram as histórias de seus livros. Um exemplo óbvio é o alcoolismo, tema muito recorrente em suas obras.
    Acredito que todos devem dar uma chance a essa obra.
    Beijos.

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  2. Sempre admirei o trabalho do King mesmo tendo começado a ler suas obras recentemente. Super concordo com o título de Mestre.
    Sobre a Escrita conheci através da minha booktuber fav e me interessou muito, como leitora e admiradora do autor.

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  3. Olá, Rodolfo

    Sempre tive vontade de ler algo do Stephen, mas nunca tive a coragem. KKKKK
    Esse parece ser muito interessante, já vi muita gente elogiando, muitos escritores até.
    Como estou numa vibe de não-ficção, talvez eu leia ele

    Beijos

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  4. Realmente, acho que ninguém vai reclamar desse título que ele recebe. Não sou de ler muitas autobiografias, mas algumas valem a pena, principalmente para o principal público alvo dele né? Os escritores que estão no início devem ter recebido um grande presente.
    Deve ser maravilhoso acompanhar essas dicas e de certa forma entender um pouco como ele mesmo é um autor tão renomado :)

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  5. Aaah, Stephen King, tenho muita vontade de conhecer a escrita dele, há tempos, não li ainda por falta de dinheiro, não por medo, sou uma pessoa bem corajosa.
    É quase uma autobiografia esse livro, que é muito importante para os novos escritores, ter essa obra do King como exemplo para escrita dos seus livros.

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  6. Rodolfo!
    Tenho esse livro na estante já há algum tempo e sempre pensando em achar o momento certo para fazer a leitura, porque espero aprender muito com ele.
    Vixe! Gosto muito de usar advérbios também... acho que nunca conseguirei ser uma escritora...kkkk
    Fato é que qualquer livro do mestre, sempre vale a pena ser lido e esse que dá dicas e referências para quem almeja ser escritor ou já o é, deve ser uma leitura bem diferente dele.
    cheirinhos
    Rudy

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  7. Eu só chamo King de Mestre e com muito orgulho!É sem sombra de dúvidas um autor que gosto demais, demais e sempre(mesmo não dando de acompanhar o tanto de livro que ele escreve) ler tudo que ele nos traz.
    Ainda não li esse livro em particular, mas de quebra, li e ouvi muito a respeito dele. E oh, pegar dicas do Mestre assim, quase na faixa não é pra qualquer um não!!!
    Espero ainda ler para aprender um pouco mais!
    Beijo

    Angela Cunha Gabriel/Rubro Rosa/O Vazio na Flor

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  8. Oi, Rodolfo! Vc não poderia descrever melhor a escrita de Stephen King. Magnetismo puro! Eu sou fã de seus livros, mas ainda não li suas obras não ficcionais. Dança Macabra é o que mais quero ler. Como apreciadora do gênero terror, esse livro desperta mto minha curiosidade. Sobre a Escrita parece conter dicas valiosas para quem almeja esse universo de contar histórias. Vida longa ao mestre!

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  9. Oi, Rodolfo!

    Fiquei super feliz de ver uma resenha do King por aqui. Ainda não tive oportunidade de ler nada dele, apenas comecei a ler O Iluminado, mas PDF me cansa demais, então retomarei a leitura quando tiver o físico, mas até onde li, eu amei a escrita. É daquelas que simplesmente fluem.

    Já tinha visto esse livro por aí e não me interessei, justamente porque não é uma ficção, mas lendo sua resenha percebo que é um livro muito interessante quando o leitor já leu várias obras do King, porque aí fica mais claro os processos de criatividade do autor. De qualquer forma, acho que é um livro bem válido.

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  10. Olá, Rodolfo
    Não li nada do autor, mas acompanho muitas pessoas que indicam King sempre. Tenho vontade de ler, espeto um dia ter oportunidade.
    Esse livro o autor trás muitas memórias e dicas para o leitor que já é escritor, começando a escrever, que pretende começar escrever ou só que quer ler mesmo. E lendo essa resenha parece que o autor conversa conosco.
    Beijos

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  11. Sigo sem ter lido nada do King, mas a cada resenha eu percebo o quanto o cara é um gênio - vou tentar ler algo dele em breve.
    Sobre esse livro, achei a interessante essa premissa, parece uma boa leitura tanto para quem quer começar na escrita tanto para quem é fã do autor e quer conhecer esse início dele.

    Abraços

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  12. Sou doida para ler algo do King, finalmente decidi por qual começar, mas tenho enrolado um pouco. A premissa desse livro é boa, parece ser bem diferente dos outros que ele já escreveu. Os quotes são ótimos!!
    Beijos

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  13. Olá! Além de ser um ótimo livro para se obter dicas sobre a escrita, parece que também é uma boa maneira de conhecer um pouco mais sobre esse escritor fantástico, que é um verdadeiro mestre em nos entregar enredos para lá de assustadores, mas que também podem ser reflexivos e que sempre têm muito a nos ensinar.

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  14. OLA
    nunca li nada do autor ,estou com um livro dele A espera de um milagre aqui esperando para ser lido.
    sei que é um autor talentosissimo ,mas não gosto de terror .e que legal que ele tem essa humildade .importante isso . gostei de saber disso .,porque sabemos o quanto de fãs ele tem e ainda é chamado de mestre

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  15. Oi, Rodolfo!
    A parte sobre memórias não me interessou tanto, mas gostei da parte de "dicas” a escritores iniciantes ou não, e olha que eu não costumo me interessar por livros de não ficcional rsrs...
    Não conhecia esse episódio sobre Michael Carneal e o livro Fúria do autor, é bem compreensivo a atitude do King, em proibir a republicação 👏👏
    Enfim, valeu pela dica, se a oportunidade surgir lerei sim Sobre a Escrita. Bjos!

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  16. Olá Rodolfo!
    Eu gostaria muito de conhecer a escrita do autor e acho que esse será o livro perfeito, por não ser de horror. Apesar de a leitura poder ser um pouco desanimadora como você falou no começo, acho que as dicas serão valiosas, até mesmo para entendermos o processo de criação de outros escritores. Os quotes que você selecionou são bem interessantes, adorei o tom de prosa, assim nos conectamos mais com o livro. Muito triste mesmo esse episódio de Health High School, penso que o autor não deveria se culpar, mas entendo porque ele o faz.
    Beijos

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  17. A parte que eu mais gostei é saber que mesmo se tratando de King, aqui não encontraremos o seu tão conhecido e elogiado terror e que o livro serve para nos mostrar um pouco mais da história desse grande autor, que não é à toa conhecido por mestre.

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  18. Sempre quis ler uma obra dele! Infelizmente são tão caras... a primeira será o clássico it, depois cemitério de animais... e a terceira essa!

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  19. Como dizem "vivendo e aprendendo", com King é mais ou menos assim, cada vez aprendemos com ele. Fiquei surpresa com a história do massacre, e fico imaginando como o autor deve ter se sentido com tudo isso. E Sobre a escrita é um livro diferente, gostaria de ler e tirar as curiosidades que fãs sempre tem.

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  20. Oi Rodolfo,
    Gostei dessa mistura com dicas para escritores envolvendo memórias, afinal memórias do King são um bom caminho para conhecer e se espelhar, não é mesmo?
    Já pelos trechos fiquei curiosa, a reflexão sobre o processo da escrita é interessante, esse estilo de obra de não ficção chama minha atenção.

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  21. De não ficção eu geralmente corro, mas King é rei e por isso Já fiz uma secessão pra ler esse livro. O fato de ser curtinho e ter indicações de livros que ele curte também ajuda bastante.

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