Cortesia da Editora Rocco
A reconstrução do mundo
Desde a infecção maciça da humanidade pelo fungo Cordyceps, os sobreviventes que conseguiram se organizar buscam a cura. Aqui vale um corte para explicar o universo distópico pós-apocalíptico criado por M.R.Carey. A ideia tem início em seu livro anterior "A menina que tinha dons". Crianças são mantidas presas em uma base militar a fim de serem estudadas para uma possível cura dos males causados pelo fungo. Por que crianças? Porque algumas delas mesmo infectadas não agem como zumbis, usam a inteligência e podem ser um indicativo de que seu corpo carregue o antídoto para este mal.
Título: O Menino da PonteOnde comprar: Amazon
Autor: M. R. Carey
Tradutor: Edmundo Barreiros
Série: A menina que tinha dons
Editora: Fábrica231
Gênero: Distópico, Young Adult
Páginas: 384
Edição: 1ª
Ano: 2020
Voltemos agora para O menino na ponte (Fábrica231, 384 páginas). O problema persiste e as cidades fantasmas vão se tornando comuns. Não há como caminhar livremente pelas ruas tomadas pela vegetação. O mundo se tornou selvagem e perigoso, cheio de famintos (zumbis infectados pelo fungo) e lixeiros (grupo de humanos saqueadores não infectados que seguem em comboios roubando tudo aquilo que possa lhes garantir a sobrevivência, nem que para isso tenham que matar).
“No entanto, as cidades grandes e pequenas mudaram de forma indescritível. Eram construídas para pessoas e, sem pessoas, não têm identidade nem propósito. Perderam a memória. Há vegetação por toda parte, suavizando os megálitos construídos pelo homem em formas novas e irreconhecíveis. Prédios comerciais se transformaram aos poucos em platôs, praças públicas se metamorfosearam em bosques ou lagos esvaziadas do passado que as definia, elas se entregaram sem protesto, deixando de ser assombradas por significados humanos.”
Partindo de uma fortificação militar em Beacon - Inglaterra, dois blindados saíram em expedição na busca de uma cura. Os laboratórios blindados Charles Darwin (Charlie), que está desaparecido, e Rosalind Franklin (Rosie). O espaço dentro de Rosie é limitado e leva duas equipes, uma científica liderada pelo Dr.Alan Fournier e sua escolta liderada pelo coronel Isaac Carlisle, um veterano que ainda não quer se curvar ao sistema, mas que fez escolhas duvidosas no passado. Ao todo 12 passageiros, num espaço reduzido. Na equipe civil há um garoto de 15 anos chamado Greaves, um pequeno geniozinho com espectro autista, que odeia ser tocado. Ele inventou um gel que bloqueia o cheiro possibilitando-os andar entre os famintos sem serem notados.
“Deve ser ao calor que os famintos respondem, não à luz. Greaves acha que o que está vendo é um efeito colateral do mecanismo que lhes permite caçar presas vivas à noite apenas pelo calor corporal. Eles estão seguindo o sol como se o achassem apetitoso.”
A maioria dos tripulantes não acredita que Greaves possa ser a chave que dará à humanidade uma possibilidade de cura. Aliás, alguns sentem antipatia a ele, menos a epidemiologista Samrina Khan, que o tem sob sua proteção e que praticamente obrigou sua presença.
Em uma de suas saídas do laboratório blindado para coleta de material para pesquisa, a equipe se depara com crianças, porém Greaves observa que uma das crianças parece ser diferente, os famintos não a atacam.
“Por outro lado, se a garota é humana, por que os famintos não farejam sua humanidade e respondem a ela? Viram-se sobre ela e devoram o que conseguirem? Ela não pode estar usando bloqueador E. Beacon é o único lugar em toda a Grã-Bretanha onde o gel protetor é fabricado, e ela não é de Beacon.”
E é o estudo do cérebro de uma destas crianças que é morta numa das saídas da equipe e mais a observação de uma menina que parece liderar estas crianças que faz com que Greaves tenha esperança de encontrar a solução para a pandemia que solapa o planeta.
“A mais rápida de todas é a menina. Ela corre abaixo da ave, se encolhe e salta. Ela atinge Greaves bem no peito e o escala em um instante. Um pé se apoia na dobra de seu braço e o outro em seu ombro.
Ele contém um grito. Não que ela o tenha machucado. Ela é tão leve que parece ter ossos ocos, como a ave. Mas ele tem forte aversão a ser tocado, especialmente sem um aviso. Ele sente, por um segundo, como se alguma bolha que o envolvia tivesse explodido. Como se estivesse nu para o espaço hostil.
A garota toma impulso, salta e gira no ar.
Pega a ave em pleno voo com uma das mãos estendidas.”
Ele contém um grito. Não que ela o tenha machucado. Ela é tão leve que parece ter ossos ocos, como a ave. Mas ele tem forte aversão a ser tocado, especialmente sem um aviso. Ele sente, por um segundo, como se alguma bolha que o envolvia tivesse explodido. Como se estivesse nu para o espaço hostil.
A garota toma impulso, salta e gira no ar.
Pega a ave em pleno voo com uma das mãos estendidas.”
Não há como não traçar um paralelo com o que está acontecendo conosco. O COVID-19 é uma realidade pra lá de indigesta, alterando nosso modo de ver e viver a vida. A convivência em espaços reduzidos, a limitação ao direito de ir e vir, força-nos a criar novos hábitos e regras.
O fungo Cordyceps realmente existe, porém ele infecta apenas formigas de determinada espécie. As formigas infectadas são forçadas pelo fungo a procurar um lugar em que possa se desenvolver (as formigas são zumbificadas). O fungo começa a crescer e causa a morte de seu hospedeiro. M.R. Carey parte de uma premissa possível: e se uma mutação deste mesmo fungo começasse a infectar os humanos?
“Ele sabe como o Cordyceps deve funcionar, como funciona em todo faminto estudado até então. Segundos após a infecção primária, inunda a corrente sanguínea do hospedeiro humano, onde prolifera com velocidade impressionante. Tendo atravessado a barreira sangue-cérebro, ele se aloja no tronco encefálico e lança um ataque rápido, desativando o funcionamento neural normal por meio de um superestímulo destrutivo das células nervosas. Ele esgota o cérebro.”
Há um jogo chamado "The last of us" que já explorou este mesmo tema e agora pode ser mais uma vez saboreado através deste livro de M.R.Carey. Uma praga dizimando a humanidade. Porém a grande discussão é "o que é ser humano"? O que faz um humano ser humano? Seria sua capacidade de discernimento? Seriam as decisões tomadas diante da adversidade?
“A dor não tem nenhuma agenda. Ela não nos ensina nada, só o que dói. Se não puder evitar as coisas que doem, qual a utilidade da lição?”
Em um mundo tomado pelo fungo o determinismo de Darwin seria mais uma vez o bote salva-vidas? Adaptar-se para não sucumbir, suportar a dor, aprender com ela, fará com que os sobreviventes tornem-se lendas. Gostoso de se ler, o final me surpreendeu positivamente, é a tradução perfeita para a palavra "esperança".
Se você quiser conhecer um pouco sobre os livros anteriores desta série, clique nas capas para ler as resenhas:
Oi Rodolfo,
ResponderExcluirLi Feelside e foi uma leitura bem longe da minha zona de conforto literária. Mas mesmo assim, interessante.
Nessa história também aparecia uma criança um tanto quanto diferente.
Olá,
ResponderExcluirAchei a capa do livro super interessante, ela não tem nada de mais (na minha opinião), mas mesmo assim, gostei dela.
A sua resenha me deixou com muita vontade de ler o livro, fiquei super empolgada e querendo saber os detalhes de tudo,
Beijos
Rodolfo querido!
ResponderExcluirQuestão bem filosófica:"o que é ser humano?" e acredito que o livro mostra as diversas faces da humanidade, principalmento em momento de crise extrema como o que eles estão passando.
Interessante a analogia que o autor fez com o real virus que ataca as formigas e adaptou para uma realidade humana.
cheirinhos
Rudy
Oi, Rodolfo! Distopias pós-apocalipticas sempre despertam meu interesse. Essa questão da sobrevivência num meio escasso de recursos é algo que explora e questiona o que de fato nos caracteriza humanos. Como vc mencionou, é impossível não trazer essa temática pra junto da nossa realidade.
ResponderExcluirOi, Rodolfo!
ResponderExcluirEsse livro me parece bem interessante, eu nunca tinha ouvido falar. Mas confesso que só de ler sua resenha já fiquei meio apavorada. De fato, não tem como não relacionar o momento que estamos vivendo atualmente, com uma distopia que aborda situações semelhantes, é de arrepiar pensar em algo assim. Por ser uma leitura mais pesada (principalmente por conta do momento que estamos vivenciando) é uma leitura que atualmente passaria. Estou procurando por coisas mais leves e que me façam distrair e não ficar mais preocupada. HAHA Mas se fosse outro momento, acho que seria sim uma leitura bem interessante.
Fiquei bem curiosa com o primeiro parágrafo. Te confesso que não leio esse estilo, mas adorei acompanhar a resenha, talvez esse termo "infecção maciça" me lembra alguma coisa? HAHAHAHA
ResponderExcluirFiquei esperando a sua opinião e que bom que gostou tanto! Adoro ver esses aspectos positivos e mesmo não sendo minha zona, acaba surgindo uma curiosidade, como tudo terminou ou não..
Abraços
Esse livro tem dividido bem as opiniões e eu adoro quando isso acontece! Pois traz como a literatura pode funcionar a cada um de nós.
ResponderExcluirEu não sei se faz meu estilo, mas eu amo esse universo de vírus, infecções(tá, eu sou louca rs) mas fico apreensiva quando envolve crianças.
Mesmo assim se puder, quero já ler os dois livros!!!
beijo
Angela Cunha Gabriel/Rubro Rosa/O Vazio na Flor
Adoro ler livros que não tem nada a ver com o que eu gosto e esse livro é um deles então desejo muito ler. Não conheço escrita da autora. Esse livro tem mistério, suspense e um pouco de terror, tudo que eu gosto de ler, mas um pouco de ficção científica.
ResponderExcluirnao conheço a escritora, mas ta no estilo perfeito pra mim que comecei the 100 agora hahahha gosto de livros que qustionam não só o personagem, mas a capacidade humana, e esse tipo de livro sempre testa os limites da humanidade e nossos instintos
ResponderExcluirAchei interessante você ter dito que era um livro que trazia esperança, pois ao começar a ler sobre, não foi o que me passou pela cabeça haha. Esse tipo de livro geralmente me dá até um mal estar, ainda mais agora que estamos enfrentando uma pandemia. Não sabia que esse fungo é real nas formigas, muito legal (mas desesperador pensar na mutação para afetar os humanos.. Não duvido de nada hahah).
ResponderExcluirBeijos
É a primeira vez que leio algo sobre esse livro; traz uma temática atual, interessante e me parece ser uma leitura enriquecedora. Só acho que não conseguiria me envolver com a história.
ResponderExcluirAbraços
Oi, Rodolfo
ResponderExcluirTenho esse livro na lista de desejos, mas não sabia que era continuação de série.
Sua resenha é a primeira que leio e foi super esclarecedor saber da trama que envolve o leitor do começo ao fim. E que não está muito diferente da nossa realidade.
Estou super curiosa para ler, beijos.
Ola
ResponderExcluirum livro que trata de um tema parecido com nossa realidade . espero que esse fungo fique mesma só nas formigas , o ser humano já está com problemas demais
Olá Rodolfo!
ResponderExcluirA trama me lembrou um pouco de Maze Runner, mas achei a história extremamente inteligente. Gostei do fato da autora utilizar um pouco de realidade na história, como o fungo que existe na vida real, mas imaginar uma possível mutação, já que o mundo anda tão mudado. O protagonista também trás a representatividade das pessoas autistas, e de como eles são mal compreendidos pela sociedade. Uma história que parece ser mesmo excelente.
Beijos
Olá! Realmente esse livro chama a atenção justamente por essa similaridade com a nossa realidade, de fato, nós humanos precisamos nos fazer esses questionamentos, já tinha lido sobre o jogo, mas ainda não tinha lido uma resenha sobre o livro que o inspirou, gostei de saber um pouco mais sobre esse universo.
ResponderExcluirLivro bem interessante, mesmo não sendo o estilo que leio, mas gostei. Para mim é uma leitura bem diferenciada, porém bem válida. Talvez eu leia em breve.
ResponderExcluirOi, Rodolfo!
ResponderExcluirNão sou fã de livros pós-apocalípticos, zumbis, sobrevivência da humanidade acima de tudo... provavelmente por isso não me interessei pela trama de O Menino na Ponte, mas amei sua resenha, parabéns!
Bjos!
Impossível não fazer um paralelo com a nossa realidade ao ler essa resenha e foi isso que mais me deixou assustada e querendo correr para as colinas ao invés de tentar a leitura!
ResponderExcluirOi, Rodolfo
ResponderExcluirTentei ler o primeiro livro e não gostei, abandonei. kkkk
Mas esse parece ser mais interessante. Esse vírus que zumbifica as formigas eu não sabia que existia, já deu um medo aqui.
Pelo jeito é um livro que nos faz questionar e refletir sobre muitas coisas referentes ao que somos como humanos, né?
bjs