Cão, Vol. 03 - Série Boudica [Manda Scott]

A capacidade de suportar a dor

Em Boudica – Livro 1: Águia e Boudica – Livro 2: Touro, temos o desenvolvimento e as angústias dos personagens retratados de forma poética e excepcionalmente trabalhados por Manda Scott, que nos faz adentrar num universo de guerreiros fieis aos seus deuses e costumes.

Voltei à saga de Boudica como quem volta ao aconchego de uma amante. Porém, perceber a personagem invocando seus ancestrais como uma vidente, gerou um pouco de estranheza e desconforto num primeiro momento – logo ela, que é a guerreira brutal dos Icenos, portadora da Vitória apelando para os mortos –, mas acabei me acostumando. Nos volumes anteriores Manda Scott já havia me ganhado com diálogos fortes, incisivos e definitivos. Com este volume ela me alçou ao patamar de fã.

Título: Cão
Autor: Manda Scott
Tradutor: Claudia Gerpe Duarte
Série: Boudica
Editora: Bertrand Brasil
Gênero: Romance Histórico
Páginas: 592
Edição: 1ª
Ano: 2011
❤ Favorito

Onde comprar: Amazon

Em Boudica – Livro 3: Cão (Bertrand Brasil, 592 páginas) o personagem principal é a batalha – ou melhor, as batalhas – os combates viscerais, corpo-a-corpo ou aqueles mantidos apenas na mente de personagens atormentados pelo passado e pelo misticismo. Este livro é tão diferente dos anteriores que chegamos a pensar que é escrito por outra pessoa que não Scott. Pode considerar este comentário como um elogio, porque a autora continua maravilhosa em sua narrativa. Fui literalmente jogado dentro de cada batalha, as descrições são todas ricas em detalhes. Se você acha que me cansei dos embates carregados de sangue, enganou-se, cada vez mais me encontrei torcendo para que a guerra começasse, só para sentir cada nova palavra arremessada pesadamente como uma espada.

Neste livro Boudica precisa se unir a ‘Tagos, que se auto intitula “rei” dos icenos. Por sua vez ‘Tagos tem um pacto com os romanos que sitiaram o leste da Britânia e governam com mãos de ferro a mando do imperador Nero, cobrando impostos e impondo suas leis. Boudica deverá tomar uma difícil decisão, que colocará em risco seus filhos e amigos. Só há uma pessoa que poderá ajudá-la, uma pessoa que há muito renunciou à batalha e se encontra exilado na Hibérnia: seu meio-irmão Bán, hoje Valerius. Cabe a Luainmac Calma, o vidente ancião de Mona, convencê-lo. Da reconciliação dos irmãos depende o futuro de toda a Britânia. O ato de sonhar, tão corriqueiro em nosso dia-a-dia, para os bárbaros da Britânia é fortemente ligado aos deuses, um canal com o divino. Misture isso aos diversos momentos de tensão e violência das batalhas e uma gama de emoções tão variadas, como: culpa, redenção, vingança e perdão; e teremos um livro para pessoas fortes e/ou emotivas, cheio de momentos dramáticos, tais como quando Graine (filha de Boudica e vidente de grande poder) se vê diante na inevitabilidade da guerra:

“Naquele momento, aos seis anos idade, em pé com a relva molhada até os joelhos… GrainenicBreacamacCaradoc, sucessora da linhagem real dos icenos, compreendeu com esmagadora certeza a verdadeira impotência dos deuses quando as forças que eles põem em ação com a melhor das intenções destroem aqueles que lhes pediram ajuda. A enormidade desse fato – a ilusão de esperança quando só havia a certeza da morte – esmagou a menina.”

O que me deslumbra na escrita de Scott é sua capacidade de captar as nuances do relacionamento humano e a sutileza ao tratar de uma perda:

“— É preciso tempo para curar a dor da perda, depois é preciso tempo para curar a lembrança da dor e a convicção de que a honra exige que sustentemos essa dor para sempre. Mais tarde, é preciso mais tempo ainda para descobrir que os amores do nosso passado podem continuar a ser amados, que algo novo – ou algo antigo, reavivado – não os diminui. E depois, embora possamos saber que isso é verdade para os outros, embora o vejamos nos outros e desejemos falar a respeito disso todo os dias, é mais difícil enxergá-lo igualmente em nós mesmos.”

Pra finalizar, e não menos importante, podemos perceber, que muitas, vezes a pena é mais pesada que a espada e as guerras nem sempre são travadas em campo aberto, muitas vezes são travadas em olhares, gestos e documentos de uma Roma burocrática:

“Dentro do espaço de uma frase, estavam travando combate, tão claramente quanto se as espadas já estivessem ensanguentadas.”

O final do livro é tão belo que me deixou engasgado, pensando o quanto havia valido a pena ter lido mais de 1500 páginas para chegar até àquele momento. Em resumo, o livro é imperdível e altamente recomendável!

Agora aguardo ansioso a chegada do 4º e último volume da série. Logicamente, fiquei um pouco frustrado de ainda não ter sido lançado, já que os 3 primeiros volumes foram lançados em 2011. Então vamos aguardar ansiosamente pela conclusão.

Esta saga que para mim já é um clássico.

Se você quiser conhecer um pouco sobre os livros anteriores desta série, clique nas capas para ler as resenhas:

Top Comentarista de Julho